“Um Lugar Silencioso” | Crítica
Postado em abr. 20, 2018
Segure-se na poltrona, prenda a respiração e embarque em uma jornada imersiva neste marcante filme de suspense e terror.
O filme conta a trajetória de uma família que precisa fazer extremo silêncio para poder sobreviver em um mundo pós-apocalíptico. Qualquer barulho pode denunciar sua localização e transformar suas vidas uma zona de caça graças à criaturas que se baseiam em uma super audição para matar qualquer ser vivo.
O longa é dirigido, protagonizado e roteirizado por John Krasinski, que traz um ótimo trabalho nesta obra que envolve o espectador em uma história profunda e imersiva. O roteiro fabuloso é cheio de pequenos conflitos com um andamento bem rápido, onde o clímax se apresenta já quase no início e se mantem em altíssimo nível ao longo do filme. As partes de ação, suspense, terror e horror se misturam de uma maneira muito coesa e fluida, principalmente da metade para o terceiro ato, onde os acontecimentos giram em torno do mesmo assunto e em uma só sequência.
No começo do filme somos apresentados à família e ao mundo que estamos vendo, tudo de uma maneira bem cadenciada, porém sempre deixando o espectador apreensivo com os acontecimentos e até mesmo com a possibilidade deles. O trauma vivido pelo grupo logo neste início tem consequências que rodeiam não somente as decisões dos personagens, mas também o peso emocional que o longa te insere. Logo neste começo já percebemos que o roteiro é corajoso e se mantem assim até seu final.
As soluções para viver em mundo onde deve-se fazer o mínimo de barulho possível tem uma riqueza detalhes muito grande, desde o caminho de areia colocado no chão para deixar as pisadas mais “fofas”, até a comunicação e resoluções de problemas que fazem muito sentido em um contexto realista. Tudo isso traz uma criatividade muito grande para o longa, as cenas não se repetem, ainda que em situações semelhantes em busca de um mesmo objetivo, o meio para alcançá-lo é sempre diferente.
A ambientação e as sensações dos personagens são sentidas por todos que estão assistindo. O diretor soube trabalhar muito bem o silêncio e as emoções dos personagens, que muitas vezes são passados para o espectador com uma trilha bem pontual ou com uma ausência desse som que chega a ser agoniante, deixando aparente os sons do ambiente e usando do efeito “doppler” para deixar tudo mais imersivo.
O design de som é bem compreendido e traz um trabalho admirável, como por exemplo a cena em que a filha ( Millicent Simmonds ) está com seu aparelho auditivo desligado e vemos em segundo plano uma criatura se aproximando sorrateiramente. O modo como a narrativa passa da primeira para a terceira pessoa é surpreendente, pois quando o enfoque está na garota, o silêncio reina. Já quando a câmera assume o papel de observador, podemos ouvir com clareza os sons de respiração e passos do ser que cada vez mais diminui a distância com a menina.
A fotografia é outro ponto admirável, inserindo filtros avermelhados juntamente com acontecimentos do filme que usam de lâmpadas vermelhas para indicar o perigo. Toda tomada de câmera é criativa, brincando com o espectador, colocando os personagens nos cantos da tela ou contra a luz, deixando a visão do cenário mais aberta e destacada, o que torna a experiência mais imersiva e traz um clima tenso para a produção, afinal estamos sempre na expectativa de que algo aconteça ou alguém apareça.
Os planos fechados também são bem trabalhados, ressaltando a atuação e dando importância aos acontecimentos, como em tomadas em que a criatura aparece e já não é mais preciso trabalhar com os planos abertos que indicam uma possibilidade de perigo. Um bom exemplo é a cena do milho, onde as crianças estão confinadas num armazenador de grãos e a criatura acaba caindo junto com eles. Como a tela abrange apenas os rostos dos meninos e foca em suas expressões, é o som que guia o espectador sobre o próximo ataque do animal, que se move em desespero na tentativa de matar e também não morrer soterrado no meio do alimento.
Um ponto positivo é que mesmo com muitas cenas a noite, o longa não se furta em mostrar a criatura e não se torna de difícil discernimento, como em casos de filmes que a tela toda acaba quase negra e vemos apenas alguns pequenos pontos de luz. “Um Lugar Silencioso” acerta em mostrar com nitidez a criatura, sem fazer muito mistério sobre sua aparência e sem saturar o espectador a ponto de perder a graça.
A atuação de todos é algo muito importante e bem feito, podemos sentir cada sensação apresentada por eles, mesmo que o filme utilize “poucas falas”, porém o destaque fica para Emily Blunt , que mostra com veracidade um instinto de sobrevivência, proteção, medo e angustia além de se provar ser a “cola” que mantém a família unida. Ela se mune de todas essas emoções (até simultaneamente em determinadas cenas) e luta com si própria para manter-se em silêncio, tornando tudo tão real que faz o público prender a respiração e se segurar na cadeira do início ao fim.
Para aqueles que são apaixonados por uma boa referência, é possível notar inspirações em “Jurassic Park”, “The Walking Dead” e até mesmo no game “The Last of Us”. Tudo com uma visão pós apocalíptica ameaçadora e com o risco iminente de morte e caos que acompanha toda a trajetória da família.
Talvez o único defeito no filme seja a solução para “derrotar” as criaturas, que deixa uma sensação de: “como a humanidade não teria descoberto isso com maior antecedência?”, mas mesmo assim é compreensível e compatível com o nível de periculosidade que estes monstros trazem. O longa é incrível etraz um roteiro exuberante, que se mescla com a excelente direção e atuação mais perfeita ainda, fazendo de “Um Lugar Silencioso” uma ida quase que obrigatória ao cinema. Tambémmostra que o gênero não precisa seguir a temática de “Jump Scare” para ser bem sucedido.
Nota: 9,5