O Tocante “O Mínimo Para Viver”
Filme que aborda distúrbios alimentares estreou em julho na Netflix.
Postado em ago. 01, 2017
É inegável o brilho que Lily Collins (Simplesmente Acontece) deu a personagem Ellen em “ O Mínimo Para Viver ”. Lançado na Netflix agora, em julho de 2017, o filme foi comprado pela plataforma após a apresentação no Festival Sundance deste ano.
A atriz, que já sofreu distúrbios alimentares anteriormente, interpretou brilhantemente a personagem Ellen, que vive entre uma clínica e outra obtendo tratamentos para anorexia. De acordo com Lily, o filme foi “libertador”, como se estivesse se despedindo de demônios que lhe assombraram por muito tempo.
“ O Mínimo Para Viver ” narra a trajetória de Ellen, uma jovem com muito talento para o desenho, mas que não está mais tão interessada em continuar vivendo. Ela desenvolve anorexia e enquanto transita de uma clínica para outra, seu estado piora.
O filme não discorre sobre como Ellen desenvolveu a doença. Não temos uma introdução de infância ou mesmo da personagem folheando revistas, consumindo a imagem vendida na TV, etc. Quando a conhecemos, já está magérrima e sendo expulsa de uma clínica por ser má influência para as outras pacientes.
Ellen é filha de pais separados e vive com a madrasta, Susan, a irmã, Kelly, e o pai, que se faz tão ausente na vida da família que sequer aparece no filme, o que aponta um vazio da figura paterna e em uma falta que pode também ser um dos fatores que agregam peso ao estado da personagem.
É interessante perceber como Ellen não se importa quando dizem que ela está muito magra e também não se incomoda com o apelo familiar da madrasta e da irmã. Na cabeça da personagem, ela realmente tem tudo sob controle e está cada vez mais próxima de atingir seu idealizado corpo perfeito.
Há uma cena importante que é quando a irmã de Ellen a desafia a contar todas as calorias do prato que a madrasta preparou. E a moça acerta em cheio, comprovando sua neurose em ter exata ciência de todo valor calórico que ingere.
Ao que tudo indica, a mãe de Hellen a mandou para viver com o pai pois não podia mantê-la, seja pelos custos do tratamento ou pela antipatia que sua namorada aparenta ter pela garota. O fato é que a protagonista não tem para onde correr e é obrigada a aceitar todos os tratamentos a que a família a submete.
A madrasta de Ellen se mostra uma mulher extravagante, faladeira e um pouco inocente demais para perceber a inconveniência de suas palavras e ações. Ela participa com a protagonista da primeira cena perturbadora do filme, que é quando a mede, pesa e fotografa a enteada apenas com roupas íntimas, mostrando a imagem para a garota enquanto a questiona se ela realmente se acha bonita daquele jeito. É notável o sentimento confuso que Susan tem por Ellen, devido ao incomodo, tristeza e preocupação que transparece em seu semblante ao ver o corpo miúdo e frágil da garota.
Porém também é visível o desinteresse da protagonista em tentar compreender ou aceitar a mulher como uma figura materna.
Por fim, Susan consegue marcar para a enteada uma consulta com um renomado médico especializado em tratamento de distúrbios alimentares. Há também uma pequena ameaça para conseguir persuadir Ellen a comparecer no consultório. No fim das contas, ela acaba indo.
Eis que o médico é ninguém mais, ninguém menos que Keanu Reeves. Ele instrui Ellen desde o começo de que não irá trata-la, caso ela não deseje viver. Seus métodos vão se apresentando durante o filme e, por mais que ele realize visitas diárias aos pacientes, achei um pouco relapso.
Ellen aceita ser internada novamente, e desta vez ela fica confinada em uma casa com outros jovens que também sofrem com distúrbios alimentares. Tudo sob a supervisão do médico, que faz visitas e acompanha um pouco o dia-a-dia de cada um.
Conforme o filme vai se desenrolando, o vemos realizar com Ellen algumas tentativas de trazê-la para uma melhora, tanto física quanto psicológica e emocional. Porém ainda é um tanto relapso em questão de tratativa. As respostas que ele dá claramente não são suficientes para a protagonista, mas ela as aceita por um tempo. Não vou me apegar aos detalhes do restante da trama (pois ficaria meio cansativo para vocês lerem, certo?) Mas, basicamente, por um tempo, Hellen aceita as coisas que são impostas e chega até a criar um clima agradável com os colegas de internação. É bonito de ver um tentando motivar o outro e como as amizades fortalecem e auxiliam na recuperação. Porém, em determinado ponto, vemos sua recaída e sofremos junto com ela.
É complicado ver as coisas sob sua perspectiva, pois começamos a compreender toda a complexidade mental que envolve este processo de compulsão. Como os laços familiares não são o bastante para curar as feridas e como o sentimento de solidão e rejeição faz as coisas piorarem bruscamente. Neste ponto, o filme acerta em cheio, pois causa a reflexão.
Qualquer um consegue ver de fora uma situação e julgá-la. Todo mundo tem a solução perfeita para os problemas dos outros, mas a verdade é que ninguém conhece todos os lados da história ou como as pessoas realmente se sentem. E o filme traz isso à tona quando claramente vai passando aos poucos algumas informações cruciais e, especialmente, com a ausência do pai de Hellen, que deixa até o público irritado com tamanho descaso.
Então, o médico resolve que, será por bem, deixar que Hellen atinja o fundo do fundo da raspa do poço para poder então ver seu real estado e se motivar a mudar. O que também é outra questão interessante, pois não adianta apenas a família querer que a pessoa mude e se aceite. Se a própria paciente não consegue conviver consigo mesma, isso não influencia em nada para o tratamento.
Quanto ao final do filme, é um pouquinho frustrante. Não que não seja excelente, mas é que esperava um pouco mais do que deixar a critério da imaginação do público. Acreditava que algo um pouco mais “sólido”. De toda forma, não é ruim não, pelo contrário.
Agora, falando como um todo. O filme é um pouco raso em relação a história de Hellen e das pessoas que a cercam. Não é muito explicado sobre seus laços familiares e sequer chegamos a conhecer seu pai (por mais ausente que seja, ao menos uma ligação telefônica deveria ter, certo?). Também não dá para criar muita empatia pelo médico ou pelos outros personagens, pois é tudo muito rápido.
Sobre a mensagem, foi entregue com sucesso. O filme não faz rodeios e mostra mesmo como é a vida na internação, a fissura pela dieta e o “corpo perfeito” a qualquer custo. Também levanta várias questões importantes e nos faz querer ser mais gentis e compreensivos uns com os outros.
No geral, é um ótimo filme. A fotografia é incrível e a escolha das cores para cada situação faz com que nos sintamos um pouco mais próximos da trama, embora não chegue a provocar aquele sentimento de inserção mesmo.
Nota: 08